O amanhecer das criaturas: poema de Lêdo Ivo
O dia forma-se
de quase nada:
um seio nu
por entre pálpebras,
o sol que raia
e a luz acesa
no arranha-céu
que a aurora lava.
A mão incerta
deixa na rósea
carne dormida
o gesto equívoco.
Tudo é lilá
na luminosa
e vã partilha.
No dia imenso
nascem tesouros:
curvos, redondos.
O pão à porta,
depois o leite,
e o erguer dos corpos.
do livro: Os cem melhores poetas brasileiros do século (Org. Pinto, J. N)
3 comentários:
"o dia forma-se / de quase nada" - só essa imagem vale o poema
Translúcido poema...
Bom fim de semana.
Beijo carinhoso.
Pensem num amanhecer dentro do apartamento e fora dele. A mão incerta pode ser a do Criador, entre a madrugada e a noite, e a mão incerta do amante numa alcova. Tudo é lilá dentro do ap. pela luz do abajur e pode ser o lilâ da manhã nascendo. Fora nascem os tesouros, montanhas, a terra,as cúpulas. Dentro, as formas do corpo feminino. O pão e o leite nas portas das casas; e a oferenda do corpo, o gozo e os amantes se levantando.
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